O ESPELHO

Por edmarpereira

Quando chegou no seu destino, o Sol ainda não estava a pino, amarrou a sua mula e foi direto para um boteco onde tomou uma cachaça para limpar a garganta. Feito isso, foi procurar o tal mascate, que não foi difícil de achar, já que o arraial só tinha uma rua.

Aproximou do comércio do mascate, onde os objetos ficavam expostos na rua em cima de uns panos. Ficou ali por uma meia hora olhando uma coisa e outra e acabou comprando uns dois objetos já que a maioria ele não sabia qual a sua utilidade.

Quando estava saindo, seus olhos fitaram em um objeto que lhe chamou a atenção, pegou-o e o encarou, era um espelho de mais ou menos 15 X 10 cm, mas ele nunca tinha visto um.

Colocou-o no ângulo certo de seu rosto, foi quando as lágrimas brotaram dos seus olhos e disse em voz quase inaudível: — É o retrato do meu pai…ô meu pai que saudade…quantos anos que não te vejo.

Nisso, o mascate o interrompeu e disse: — Moço…vai levar esse objeto? Ele respondeu: — Vou levar.

Pagou e partiu de volta para sua pequena propriedade onde sua mulher o esperava. Faria do mesmo jeito de quando veio. Iria comendo requeijão que sobrou e bebendo água nas nascentes pela estrada.

Durante a viagem, antes de escurecer, ele pegava o espelho, encarava-o e dizia: — Ó meu pai, quanta saudade. Beijava o espelho que ele dizia ser o retrato de seu pai e guardava de novo. Nessa ladainha, chegou em casa já tarde da noite.

Depois de soltar a mula foi guardar as coisas em casa, mas o espelho ele levou para um cômodo aos fundos onde guardava suas ferramentas e onde também tinha um baú velho. Abriu o baú, beijou o espelho e guardou-o.

No outro dia cedo, tomou seu café, conversou com a mulher sobre as coisas que viu e o que comprou, inclusive uma fazenda de pano bonita que ele disse para sua mulher que era para ela fazer um vestido, mas do espelho/retrato nem tocou no assunto.

Antes de sair para a labuta passou lá no cômodo das ferramentas abriu o baú, pegou o espelho, beijou, beijou, chorou e depois partiu para o trabalho. E assim foram seguindo os dias. Bem cedo e à noite ele tinha que visitar aquele baú para pegar o espelho beijar à vontade, chorar e ainda balbuciar: — Ó meu pai, não canso de ver seu retrato, quanta saudade meu pai.

Como nada fica escondido, sua mulher começou a desconfiar que algo estava errado e passou a observar porque desde quando voltou da rua todos os dias ele tinha que entrar naquele quartinho lá dos fundos. Vou descobrir o que tem ali, pensou ela.

No outro dia, quando ele entrou no quartinho, ela já estava à espreita e assim que ele fechou a porta, ela aproximou-se da porta e por uma fresta na porta viu o que não gostaria de ver, seu marido beijando algo que parecia um retrato.

Nesse momento suas pernas fraquejaram, sua voz sumiu, mas teve forças para sair correndo em direção à cozinha de sua casa. Chorou muito, mas precisava ainda saber o que estava acontecendo naquele quartinho. Assim, quando Juvêncio chegou do trabalho a noite, não deu nenhuma demonstração de que estava sabendo de algo, mas foi deitar já planejando o que faria logo que amanhecesse e ele saísse para o trabalho.

Continua na próxima página

Gostou? Compartilhe com seus amigos(as)...

Páginas: 1 2 3